Não vou negar: a Indian Roadmaster tem se provado, nesse um ano e meio (e 20.000km) de convivência, a moto ideal para meu perfil de uso.
Confortável ao extremo, confiável, manutenção bem mais fácil do que eu esperava... apenas uma coisa me incomodava na moto: o calor excessivo vindo do escapamento, do lado direito.
Não era um calor tão intenso e insuportável quanto o da minha antiga HD Deluxe 2014 (que praticamente tirava toda a minha satisfação em pilotar aquela moto), mas com certeza ela é BEM mais quente que a Heritage M8 2018 (esta bem "fresquinha" quando comparada à Deluxe 2014), e o calor é suficiente para inviabilizar até mesmo o uso de capa de chuva em viagens (a barra da calça da minha capa de chuva literalmente derreteu).
Pesquisando no fórum americano IndianMotorcycles.net, notei que essa reclamação sobre o excesso de calor vindo do escape é uma constante nos modelos da linha (Chief, Chieftain, Springfield e Roadmaster) que usam o motor Thunder Stroke, seja o 111 seja o 116. Nessas motocicletas, a configuração de escapamento adotada pela Indian é um sistema 2x1x2, ou seja, um tubo sai de cada cilindro, se juntam em um tubo "crossover" e depois o "crossover" se separa em dois tubos, um para cada lado da moto, onde ficam as ponteiras de escapamento.
A união entre os dois tubos ocorre no lado direito da moto, entre a pedaleira/plataforma da garupa e a do piloto, conforme a imagem abaixo:
O problema é que o catalisador encontra-se justamente nessa "junção" entre os dois tubos, uma medida adotada para que a motocicleta usasse um único catalisador.
Na linha Scout (por exemplo), a solução é diferente, o catalisador fica nas ponteiras, cada uma com sua própria colmeia, deslocando a fonte de calor um pouco mais para a traseira da moto. O mesmo ocorre em algumas Harley-Davidson como a Sportster. Já a linha Touring da H-D usa catalisadores nas curvas de escape, ainda que um individualizado para cada cilindro.
Mas por que o catalisador é uma fonte de calor tão intenso? Bom, para entender isso é importante compreender o princípio de funcionamento do catalisador. Muitos confundem o catalisador com um "filtro" já que seu objetivo é reduzir as emissões de gases nocivos à atmosfera, mas na verdade o catalisador, em que pese seu formato de "colmeia", não "filtra" os gases, e sim provoca reações químicas que eliminam parte dos gases nocivos.
Algumas das reações químicas que ocorrem no conversor catalítico são mostradas abaixo:
Monóxido de Carbono + Oxigênio → Dióxido de Carbono
Compostos orgânicos voláteis (gasolina parcialmente queimada) + Oxigênio → Dióxido de Carbono + Água
Monóxido de nitrogênio + Monóxido de Carbono → Dióxido de Carbono + Nitrogênio
Um catalisador (seja em automóvel ou em motocicleta) é uma colmeia (bem densa) de materiais cerâmicos misturados a metais nobres (como a platina) que provoca uma restrição ao fluxo de gases e, por conta de sua própria construção, causa um aumento de temperatura em seu interior, sendo esse aumento de temperatura necessário para que as reações químicas ocorram. A temperatura normal de operação de um catalisador é de 150° C a 600° C, chegando a 800ºC em pilotagem mais "agressiva".
Um catalisador automotivo em corte, para ilustrar
A restrição à circulação de gases causada por essa colmeia densa não apenas provoca aumento de temperatura, como também reduz significativamente a potência do motor.
Em um carro, você até nem sente tanto essa temperatura elevada, já que há um bom isolamento térmico e geralmente o carro tem ar-condicionado (mas experimente colocar a mão sobre o túnel central em frente ao banco traseiro e provavelmente sentirá um calorzinho vindo do chão), mas em uma moto, com o catalisador grudado na sua perna, o calor é BEM perceptível, mesmo com todos os recursos que a moto tem para redução de temperatura (como os escudos de calor nas curvas de escapamento), algo ainda mais perceptível no nosso verão, em que as temperaturas ambientes não raro estão acima dos 34 graus. Junte-se o catalisador à mistura ar-combustível mais "pobre" (outra medida adotada pelos fabricantes para redução da emissão de poluentes) e você tem a receita perfeita para uma fornalha sobre rodas.
A solução mais comumente adotada (por ser a mais barata) é a retirada do catalisador do escape, mas é algo que dá algum trabalho e requer um certo "procedimento cirúrgico" no escapamento:
Retirada do catalisador do escape original de uma Indian Chief.
Fonte: Fórum IndianMotorcycles.net
O problema é que se essa modificação for feita incorretamente, pode inutilizar os coletores de escapamento originais da moto. Nos EUA, onde há uma abundância de motos Indian, existem empresas que fazem o serviço pegando sua curva de escape à base de troca, e mesmo que você opte por fazer o procedimento em casa, é fácil conseguir uma curva original usada a "preço de pinga" no caso de algo dar errado, já que muitos donos trocam o sistema inteiro de escapamento. Aqui no Brasil, é muito difícil conseguir uma curva de escape original dessas (ao que me consta eu sou o primeiro dono de Indian TS111 a trocar todo o sistema aqui no Brasil, em que pese saber da existência de algumas com o catalisador retirado), ou seja, o risco de ficar com a moto parada esperando peça em caso de fazer algo errado (até uma solda malfeita) é muito grande. Além disso, a modificação é totalmente irreversível (a menos que se compre outra curva de escape original, novamente, algo BEM difícil de se conseguir aqui nas terras tupiniquins).
Assim sendo, em vez de ter que ficar com a moto parada por alguns dias até fazer o serviço de retirada do catalisador do escapamento original, optei pela segunda opção (ainda que bem mais cara), a troca das curvas de escape por outras de design mais esportivo e que já não tivessem o catalisador, preservando o sistema original para que a modificação possa ser revertida caso isso venha a ser necessário no futuro. De quebra a troca de escapamento é mais adequada para o caso de, no futuro, eu resolver fazer mais alguns "upgrades" na moto, como uma preparação "estágio 2" (troca de comando de válvulas).
Encontrei no mercado duas opções de coletores True Duals para as Indian Thunder Stroke: a Bassani e a Freedom Performance. Optei pela Freedom Performance por três principais motivos:
1 - Compatibilidade com as minhas ponteiras de escape: os coletores da Bassani são compatíveis apenas com as ponteiras da própria Bassani, o que inviabilizaria o uso das ponteiras Vance & Hines que eu já tenho na moto; já os da Freedom são compatíveis até mesmo com as ponteiras originais da moto, ou seja, eu não precisaria gastar mais por novas ponteiras;
2 - Custo: mesmo considerando só os coletores, a opção da Freedom Performance ainda é mais barata que a da Bassani;
3 - Recomendações: Reviews e recomendações dos outros usuários do fórum americano.
A instalação, ainda que simples para alguém que já tenha alguma experiência com mecânica, é um tanto quanto trabalhosa e demorada. Acredite se quiser, mas a desmontagem do sistema original é mais difícil que a remontagem do sistema novo.
Para fazer o serviço, recorri à Kluster Moto Hub & Community, uma oficina "auto-serviço" aqui em Brasília, espaço destinado àqueles que gostam de mexer em suas próprias motos mas estão impossibilitados por regras de condomínio ou falta de ferramental ou espaço em casa.
A oficina disponibiliza todo o ferramental necessário, até mesmo plataformas de elevação. Gastei aproximadamente 8 horas de trabalho (divididas em dois dias) para fazer todo o serviço.
Na próxima imagem a motocicleta já sem o escapamento original, pronta para receber o novo sistema:
Após concluída a montagem (o kit vem completo, inclusive com espaçadores para deslocar a plataforma direita um pouco mais pra fora), eis o resultado final:
Note que a "peça única" onde os tubos se cruzam foi substituída, agora temos dois tubos de escape totalmente isolados entre si, um saindo de cada cilindro:
Em que pese eu não ser um grande fã de moto muito barulhenta (minhas ponteiras da Vance & Hines possuem os "quiet baffles", os abafadores revestidos com fibra de vidro, cuja função é justamente de reduzir o ruído), devo dizer que o ronco da moto mudou, ficando mais grave (o próprio catalisador funcionava como um abafador). Em marcha lenta o barulho ficou mais encorpado, o mesmo ocorrendo durante as acelerações. Já em velocidade constante (cruzeiro) o barulho da moto se mantém em níveis civilizados.
Obviamente serão necessários alguns ajustes na injeção eletrônica para compensar o fluxo mais livre de gases e obter algum ganho de performance (em que pese meu objetivo com a mudança ser apenas a redução do calor), mas nos primeiros dias de teste (com direito a situações de trânsito pesado) posso confirmar que o calor absurdo vindo do lado direito da moto desapareceu. Agora dá até pra pensar em pilotar de bermuda (ou mesmo usar capa de chuva durante as tempestades de verão sem que ela derreta)!!! (risos) . Esses ajustes no mapeamento vão ficar mais para a frente, pois estou aguardando a chegada de um Power Vision 3 da Dynojet. Por enquanto os ajustes configurados no módulo EJK da Dobeck que veio com a motocicleta (no qual não quis mexer, mas pretendo retirar quando chegar o PV3) são suficientes para a configuração da moto, sem qualquer sintoma de falta.
Testando a nova configuração na semana seguinte à instalação (em que vim praticamente todo dia na moto para o serviço) , a redução de calor é perceptível. Se antes havia calor excessivo vindo do lado direito, do local onde ficava o catalisador, o calor oriundo do sistema de escape não incomoda mais.
Um dos testes, inclusive, foi bem extremo para provocar aquecimento. Em um dos dias, simplesmente me segurei pra NÃO pegar corredor com a motocicleta, andando junto com os automóveis, pegando pelo menos 7km de engarrafamento do tipo "anda e pára", em que a velocidade não passava dos 20 km/h. Mesmo nessa situação, a moto ficou "fresquinha", o calor vindo do escape desapareceu. O único calor perceptível, agora, é o do próprio motor (especialmente da parte inferior e lado esquerdo, provavelmente vem do cárter), que não incomoda praticamente nada.
Ainda que a modificação tenha deixado a moto ligeiramente mais barulhenta e com certeza mais poluente, posso afirmar com certeza que a modificação me recuperou a satisfação em rodar com a moto dentro da cidade (a Indian estava com uso restrito à estrada durante o verão, pois o calor era realmente insuportável), o que muito provavelmente me levará a me desfazer da Royal Enfield, já que com o problema do calor excessivo resolvido, não tenho mais justificativa (salvo o custo de manutenção) para ter uma segunda motocicleta.
Testando a nova configuração na semana seguinte à instalação (em que vim praticamente todo dia na moto para o serviço) , a redução de calor é perceptível. Se antes havia calor excessivo vindo do lado direito, do local onde ficava o catalisador, o calor oriundo do sistema de escape não incomoda mais.
Um dos testes, inclusive, foi bem extremo para provocar aquecimento. Em um dos dias, simplesmente me segurei pra NÃO pegar corredor com a motocicleta, andando junto com os automóveis, pegando pelo menos 7km de engarrafamento do tipo "anda e pára", em que a velocidade não passava dos 20 km/h. Mesmo nessa situação, a moto ficou "fresquinha", o calor vindo do escape desapareceu. O único calor perceptível, agora, é o do próprio motor (especialmente da parte inferior e lado esquerdo, provavelmente vem do cárter), que não incomoda praticamente nada.
Ainda que a modificação tenha deixado a moto ligeiramente mais barulhenta e com certeza mais poluente, posso afirmar com certeza que a modificação me recuperou a satisfação em rodar com a moto dentro da cidade (a Indian estava com uso restrito à estrada durante o verão, pois o calor era realmente insuportável), o que muito provavelmente me levará a me desfazer da Royal Enfield, já que com o problema do calor excessivo resolvido, não tenho mais justificativa (salvo o custo de manutenção) para ter uma segunda motocicleta.
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